segunda-feira, 23 de abril de 2012

Sexta-feira Nada Santa

Como praticamente todas as famílias brasileiras, a minha também estava planejando um almoço de Páscoa. Vou ser sincera, odeio não poder comer carne e também acho que não estou devendo muito ao cara lá em cima, pelo contrário, mas não vou falar muito disso por respeito. Só queria que o dia passasse logo, mas não do jeito que passou. Na sexta-fera santa minha mãe foi hospitalizada. Uns dois dias antes da internação, ela começou a inchar muito, como ficamos preocupadas, fomos ao médico e descobrimos que não só ela teria que ficar internada, como também tinha trombose na veia cava. Como eu já sou praticamente uma médica formada em oncologia, baseada nesse meu 1 ano e meio de câncer, não esperava encontrar mais um potencial problema por causa do tumor, haha.
O que acontece é que a tal da veia cava leva o sangue para o fígado até chegar no coração. Essa putinha de veia (perdão) resolveu ficar com trombose. O pior não foi nem ela ficar internada, porque ela já ficou outras 3 vezes, mas sim o fato de que passaríamos a Páscoa que minha mãe tanto queria comemorar, no hospital. Ela estava tão empolgada que fui praticamente obrigada á tirar o sal do bacalhau e fiquei eternamente traumatizada por isso, o que eu não faço por amor? Haha.
No dia da Páscoa me toquei que não só era Dia Mundial do Combate ao Câncer, como também aniversário do meu amado avô, pai da minha mãe, que se foi em 2003. É tipo um combo, daqueles do videogame Mortal Kombat, o Fatality.
Odeio deixar minha mãe no hospital. Parece que apesar de ser o lugar que ela vai estar melhor cuidada, é o lugar que eu me sinto mais insegura de deixá-la. Com a ajuda da terapia, consegui entender que esse meu desconforto é causado pelo simples fato de eu achar que os médicos a tratam como 'mais uma' no hospital... Sendo que ela NÃO É, ELA É MINHA MÃE! Não peço que a tratem com preferência, pelo contrário, entendo que muitas pessoas estão passando pela mesma coisa ou ás vezes até pior do que a gente, mas tenho esse problema com hospitais.
Já fazem duas semana que ela está lá, sempre com um sorriso no rosto, impressionante. O orgulho que eu sinto da minha mãe ofusca qualquer medo que eu tenha. Ela têm recebido milhares de visitas, e vejo que todo esse amor é fruto do que ela plantou a vida toda dela, é a melhor mãe que uma filha pode pedir.
Outro dia ela veio me falar que teve um sonho com Nossa Senhora, com uma luz bem forte. Nem terminei de ouvir o sonho e já soltei um "Vira DE COSTAS pra luz, mãe! Ta?? Que bonita, aprecia, mas vai pra direção contrária!!"
O difícil é sair do hospital pra ir pra aula, ou para cumprir alguma outra obrigação que eu tenha. Parece que toda vez que eu saio do hospital, deixo uma parte do meu corpo lá. Sair do quarto dela, de perto dela é como puxar um íma grudado em um metal.
Um dia em especial, fui fazer uma das minhas aulas práticas (porque afinal, eventualmente eu quero tirar minha carta pra minha mãe me ver dirigir) e quase bati o carro várias vezes, não estava com cabeça, estava estressada, me sentindo sobrecarregada, minha irmã havia operado o dente e também estava preocupada. Ainda como se não bastasse, uma das pessoas nas quais eu quase bati o carro, desceu para tirar satisfação comigo. Nessas horas a vontade é de falar a verdade para a pessoa se sentir BEM culpada e calar a boca, mas não quero usar isso de desculpa.
 Na noite anterior á esse dia, minha mãe, bem á noitinha, desabafou. A sté estava em casa porque tinha ido lá de manhã e ficou a tarde também, nós revezamos. Minha mãe disse que não se sente ela mesma, que está gorda e feia e que nem aguenta se olhar no espelho. Fui ajudar ela a tomar se preparar para tomar banho e vi o inchaço na barriga dela e nas pernas. As veias que ligam a tal da veia ao fígado estavam mais aparentes. Me segurei muito para não chorar, não quero minha mãe assim, não quero ela passando por toda essa dor, eu não aguento, aguento qualquer coisa menos isso.
Depois dela tomar banho, ajudei ela a passar um creme maravilhoso do Mar Morto que eu comprei especialmente para caso as quimios deixassem a pele dela sensível. Passei o creme nela quase nem tocando, e mesmo assim não pude deixar de ver a cara de dor dela. A pele estava repuxando por causa dos líquidos retidos que estavam causando o inchaço, além da trombose.
O engraçado é que no meio de tanta merda, a gente consegue achar graça. Como sempre, estava penteando o cabelo dela, que por sinal já está bem crescidinho! Enquanto penteava, achei um nó!! Eu, minha irmã e minha mãe, três bobas comemorando! Passamos o dia jogando joguinhos no Ipad, vendo tv. Até já fingi que minha mãe queria jantar mais e quando a mulher trouxe o prato, eu que comi porque estava faminta! É o que temos pro momento, então vamos tirar algo de bom!
A verdade é que a essa altura do campeonato, não me importo da minha mãe passar o mês todo no hospital, quero que ela saia BEM, nada mais me importa.
Hoje de manhãzinha liguei para saber como ela estava e ela me disse que havia desinchado bastante, graças aos remédios! Fiquei tão feliz, tão aliviada.
Outra coisa boa que aconteceu hoje é que foi minha última aula prática, rumo á carta! Dirigir é uma coisa que está me fazendo muito bem, ainda mais em lugares tipo avenidas. Meu instrutor só ficava falando 'acelera! não pode ir devagar em avenida!', eu coitada, achando que já estava praticamente no rally dos sertões, acelerei mais. Me senti no Velozes e Furiosos, a 80 por hora, haha, mas vamos combinar, pra quem nunca dirigiu isso ja é progresso!
Para vocês verem, no fim das contas, existem problemas bem maiores do que não poder comer carne na sexta-feira santa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário